A solidão e o conhecimento das entranhas...
Sentou-se no cadeirão, junto à janela, lá fora o vento arrastava pequenos pedaços de trigo que a colheita não tinha arrecadado. Ele olhava aquela chuva amarela ao mesmo tempo que puxava, para cima das pernas, a manta de lã, com xadrez. Era neste aconchego que recebia a solidão. Estava sozinho com ele e mesmo que tivesse muita gente à volta era com ele que vivia na maioria dos momentos.
A solidão dava-lhe esse conhecimento do que de melhor e pior existia em si. Tal como uma árvore com duros ramos, a solidão ia crescendo, florescia na Primavera e parecia mesmo, nessa altura, que se extinguia, mas depois existiam momentos em que o Inverno se sobrepunha à Primavera e ela florescia por entre os ramos despidos e sem nenhuma ordem estabelecida. Certo é que ela existia sempre, podia estar por vezes encoberta, as flores podiam tapá-la, mas ela estava lá, enquanto ele estivesse.
Ela era o seu amigo secreto, o seu confidente forçado e era, sem dúvida, a sua companhia mais certa. Mas era ela que o completava porque era a solidão que o fazia olhar-se de frente, ver-se a si. Por vezes tinha medo dela, tentava fugir-lhe e, nesses momentos, rodeava-se de pessoas (quantas mais melhor).
Via-a a um canto, mas atirava-lhe um casaco para cima e fazia de conta que não estava lá, mas no fim era sempre com ela que se encontrava, porque era a si que precisava compreender e encontrar e, nessa hora, ela era a melhor aliada. Obrigara-o a conhecer-se, a completar-se a si, por si.
Pegou numa chávena de chá fumegante e deu um pequeno gole. O quente percorreu-lhe a garganta e ele sorriu. Levantou o chá, em forma de brinde, e foi nela(solidão) que pensou.
-Não devemos temer aquilo que nos ajuda a perceber as entranhas, disse(baixinho).