Da saudade à falta de espaço
(imagem retirada da net)
A chuva abraçava devagar os vidros das pequenas janelas de aros brancos, presenteando-nos com uma música ritmada e perfeita.
Ao compasso da chuva ela tentava arrumar coisas: sempre a arrumação das coisas. Abria portas; gavetas, voltava a fecha-las, abria-as, de novo. Sentou-se em cima da cama, uma cama grande e coberta de cinzento.
Quase que se confundia com a cama, caso alguém entrasse e a visse...
Ficou algum tempo a olhar, a ver tudo, como se descobrisse tudo pela primeira vez. Estranhou as coisas(sempre as coisas) e deixou-se ficar imóvel, a tentar perceber não sabia exactamente o quê. Tinha que arrumar, encontrar espaço onde guardar tudo, (embora soubesse que havia coisas que não podem ser encerradas), necessitava de lugares. Olhou as paredes brancas, lembrou-se, recordou-se de tantas coisas que as paredes pareciam telas pintadas por um pintor realista. Viu cores, sentiu os cheiros das cores, recordou olhares e sorrisos.
Tirou os sapatos e arrumou-os ao lado da cama, mexeu os pés como que para os esticar e deixou-se ficar mais um pouco. Continuou à procura de espaços, com os olhos. Cansou-se disso, levantou-se e tentou arrumar tudo de uma forma frenética e quase desordenada, mas não havia espaço. Naquele dia a saudade ocupava todas as gavetas e era impossível arruma-la. As coisas estavam lá, quietas e guardadas, mas para a saudade, para essa não havia lugares suficientes e isso era definitivo.