Azul...
Hoje decidi-me pelo azul a contrastar com a evidente escolha do vermelho. O azul fica sempre bem, o que acham?
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Hoje decidi-me pelo azul a contrastar com a evidente escolha do vermelho. O azul fica sempre bem, o que acham?
Olhou para o guarda-roupa pela décima vez e percorreu, com os olhos, as dezenas de peças que por ali habitavam. Pensou nos vestidos, mas os vestidos pareciam-lhe demasiado óbvios e não lhe caiam bem.
Sentou-se na cama e olhou para umas calças pretas e um corpete negro e dourado, mas não era aquilo. Reparou, uma vez mais, para o interior do guarda-roupa e descobriu no canto de cima o vestido que ele lhe tinha oferecido pelo Natal. O vestido era preto com relevos e assentava-lhe perfeitamente. Retirou-o do roupeiro e esticou-o, em cima da cama. Agora faltavam os sapatos, pensou. Escolheu os sapatos e o batom e arranjou-se a correr, não gostava de demorar muito tempo. Suspirou e percebeu que aquela data não lhe dizia nada. Ela preferia os pormenores do dia-a-dia, as pequenas lembranças, a segurança dentro da sua enorme insegurança. Todas essas coisas, esses detalhes eram dignos de comemoração diária, tudo o resto, essas datas programadas e que era obrigada a seguir, tornavam-na vulnerável e levavam-na a desvalorizar o que, de facto, era importante.
Olhou pela janela e uma pena cor-de-rosa, que estava dentro da caixa de sapatos,acariciou o chão. Por momentos as janelas devolveram-lhe as imagens de um salão de baile onde ela rodopiava e ali sentia-se embriagada pelos sons da música e dos risos. Durante algum tempo continuou a dançar até que o seu olhar se fixou num sofá vermelho, de veludo, onde dois meninos velhinhos estavam de mãos dadas. Parou de dançar e aproximou-se. Percebeu que estavam juntos há 50 anos e que a menina velhinha apesar de já não ter forças para dançar adorava bailes e festas. O menino velhinho decidira-se a fazer-lhe uma surpresa ao leva-la aquele baile. Estava de mãos dadas com ela e, para ele, aquele era o único lugar onde fazia sentido estar. Levantou-se, demoradamente, encaminhou-se para o meio da sala onde retirou, de uma consola do salão, uma rosa branca. Voltou, a arrastar os pés, mas a cara sorria-lhe e entregou a rosa à sua menina velhinha. Ela ruborizou e baixou os olhos com um sorriso. Se alguém perguntasse o que comemoravam eles não saberiam responder mas era fácil, para mim, perceber que era uma celebração de uma vida. Não de um dia, não de um instante mas a comemoração por muitos dias e muitos instantes. A música misturava-se com os meus pensamentos e por um momento fechei os olhos. Quando os abri estava de novo no meu quarto em frente à janela. Que disparate, pensei, porque raio teria visto aquilo. Apressei-me a colocar os brincos e, um deles, rodopiou e foi cair no chão mesmo ao lado da pena cor-de-rosa. Peguei no brinco e coloquei-o na orelha. Em seguida procurei um alfinete para prender a pena e colocá-la ao peito. Não sei porque fiz isso mas sorri. Agora apenas desejava encontrar um sofá vermelho. Fechei a porta e saí.
Há momentos em que, por mais que queiramos ser fortes e opimistas, a sombra da dúvida e a fraqueza apodera-se de nós. Parece que ninguém no mundo nos consegue entender e estamos totalmente sozinhos. É bom estar só, cada vez percebo mais isso. É na solidão que nos conhecemos e nos encontramos a nós, mas não é bom não sermos compreendidos. Para sermos compreendidos e para compreendermos temos de "gastar" tempo e o tempo, sempre o tempo, foge-nos entre os dedos e parece que nunca o temos. Mas por vezes quando olhamos bem temos até tempo em sobra. Há instantes em que estamos sós na alma....