Este não é um filme comum. São seis histórias num filme. E as histórias não são de desejos invulgares ou ficcionados, mas dizem respeito a raivas, desejos e frustrações com que todos vamos lidando no quotidiano. Quem não desejou que todos os seus inimigos desaparecessem? Quem não assistiu a verdadeiras guerras no trânsito que mais parecem, dada a intensidade, enormes crimes passionais? E descobrir que se ama a pessoa apenas depois de ambos viverem situações limite? Acuse-se aquele que não viveu ou conhece situações de multas que foram passadas e que levam muitas vezes, pela injustiça, a que as pessoas se sintam com raiva e perdidas? Como se percebe, pelo que escrevi, tudo situações comuns e que nos fazem pensar de uma forma mais reflexiva sobre princípios, valores, sentimentos e também sobre o rumo(s) que o mundo segue. O filme ganhou vários prémios, mas não é por isso que aconselho a que vejam. Penso que a mais valia de o ver é o pensar, profundamente, em várias questões e posições que tomamos enquanto seres sociais.
Descobri, com alegria, que algumas cerejeiras já estão a presentear-nos com as suas flores e apesar de já saber que a cerejeiras estão envoltas num enorme simbolismo (sobretudo no Japão onde a flor é conhecida por sakura), fui investigar e aprendi que as flores de cerejeira simbolizam a beleza feminina, o amor, a felicidade, a renovação e a esperança.
Os samurais, eram grandes apreciadores da flor de cerejeira. Desde aqueles tempos que esta flor passou a estar associada à efemeridade da existência humana e ao lema dos samurais: viver o presente sem medo. Assim, a flor de cerejeira está também associada ao código do samurai, o Bushido.
A cerejeira fica pouco tempo florida, por isso suas flores representam a fragilidade da vida, cuja maior lição é aproveitar intensamente cada momento, pois o tempo passa rápido e a vida é curta.
O fruto da cerejeira, a cereja, é considerado o maior símbolo de sensualidade, erotismo e sexualidade, principalmente pela cor vermelha intensa.
Estima-se que no Japão existam mais de 300 variedades de cerejeiras.
Corria entre os carros estacionados em cima do passeio. Todos os dias lutava contra o relógio que marcava impiedosamente a passagem de mais um minuto. Não chegou atrasada, mas quase. Vieram-lhe à memória todos os dias em que tentava chegar a tempo. Sentia que todos os dias subia uma montanha para, novamente, a descer. Todos os dias o mesmo ritmo, as mesmas coisas com o único objectivo de alcançar o cimo da montanha.
Escapava-lhe algo, pensava, ao mesmo tempo que analisava as filas de números impressos no papel.
Passou de papel em papel, de número em número até que a lista praticamente se extinguiu. Amanhã havia mais, suspirou tristemente. Arrumou a cadeira, pegou na carteira castanha e saiu. De novo teria de descer a montanha. Saiu pelas portas de vidro e já na rua olhou admirada para os narcisos já em flor. Já estariam assim há alguns dias assim,mas ela não o sabia.Estava tão ocupada em subir e descer a montanha que se esqueceu de olhar em redor e ver a vista. E a vista é, por vezes bem mais importante do que subir e descer.
Há dias em que por mais que queiramos as palavras teimam em ficar em nós como se temessem que o seu nascimento lhes traga uma luz que não interessa ser absorvida.
Quietas no seu canto, as palavras brincam com memórias, escrevem canções que nunca serão tocadas e acariciam ideias que temem nunca serem ouvidas. Quantas palavras ficam presas reféns de um ouvido que nunca está disposto a ouvi-las. Talvez se percam, entre outras palavras já ditas e não ditas.
Muitas coisas se perdem por esperarmos, outras ganham-se. Há sempre um momento em que sabemos que façamos o que fizermos vamos sempre perder ou ganhar qualquer coisa. Assim é com as palavras. Ganhamos em as guardar, mas há um vazio que fica nesse ecoar sem som. Há sempre um mar de ideias; podem ter som, ou não, mas existem e estão lá.
Talvez amanhã consiga dizer o que as palavras querem dizer, hoje não, hoje as palavras estão apenas aqui, sem estar.
Levantou-se lentamente quando ouviu que a chamavam pelo nome. Quase teve dúvidas que era a si que chamavam, talvez porque várias vezes ao longo da sua vida não fora capaz de associar o nome à sua pessoa. Arrastou os pés por entre as paredes brancas carcomidas pelo tempo e pelos vários passantes que por ali deambularam. Sentou-se, novamente, agora numa cadeira mais espaçosa.
Olhou para as pessoas em redor, a maioria cansada da espera, outras absortas em pensamentos indecifráveis. Todas à espera. Chamaram outro nome e mais outro e as pessoas desapareciam, uma a uma, engolidas por aquelas paredes e por aquele espaço que não era de ninguém.
Endireitou-se e colocou as mãos em cima do vestido azul que vestia. Pensou uma vez mais nos nomes. A memória segredava-lhe, ao ouvido, muitos nomes. Sentia-os acariciar-lhe os ouvidos e via-os passearem-se à frente dos seus olhos, via também os rostos que lhes pertenciam como um jogo em que uma peça tem de encaixar num espaço determinado. Chamaram,de novo, o seu nome. Era mesmo o seu, pensou. Mergulhou no espaço vazio das paredes brancas e sentiu que ela, era, muito mais que um nome.