Aprender a navegar com a tempestade...
Naquele dia o Sol acordou cedo, vestiu um casaco comprido e abriu de par em par as janelas de madeira.
Olhei para ele; demoradamente, sem que me visse e deixei-me estar, quietinha, nesse doce namoro. Estava deitada, no pequeno barco de remos, com uma manta verde em cima do corpo e senti-me adormecida pelo embalo da água e o namoro com o Sol. Fiquei assim muito tempo sem que o barco se mexesse muito e sem que eu tivesse vontade de me mexer. No ar ouviam-se os gritos do rio, ao tocarem no casco, e o cheiro da maresia.
Na realidade eu nada fazia para que tudo acontecesse como devia acontecer. O Sol brilhava porque sim, a água seguia o seu curso e e barco fazia o seu caminho. Eu acompanhava-os sem saber porque o fazia. Eu não sabia navegar porque tudo navegava por mim.
Os dias sucediam-se e o namoro com o Sol, com o barco e com água, também. Mas um dia, daqueles dias em que o céu fica da cor do carvão, fiquei sem Sol, a água revoltou-se, os remos caíram e a manta foi para longe. Começou a chover, a chover muito e tinha de fazer alguma coisa para conseguir resistir à revolta da água.
Agarrei-me com toda a força que tinha ao barco, e com tempo comecei a remar com as mãos. Fi-lo com força, até que consegui que o barco encontrasse um pedaço de terra e se despedisse da água. Tinha conseguido vencer uma tempestade enorme. Sentei-me na areia e chorei,um misto de alegria e de tristeza envolviam-me e esforcei-me para entender, para me entender. Tinha sobrevivido, tinha aprendido a navegar. Essa aprendizagem só foi possível porque a tempestade me mostrou. Seria impossível viver se a tempestade não tivesse vindo e eu não aprendesse a navegar.