As aldeias perdidas e o vazio
Chegou cedo naquele dia. Procurou por entre as paredes das casas as vozes de outrora, os cheiros e as imagens. Contudo, os olhos apenas lhe mostravam imagens fugidias, liquefeitas e sem corpo. Tudo parecia desfazer-se, lentamente, à sua passagem, mas ela sabia que não era o seu deambular que provocava o vazio, há muito que sabia que o nada existia antes dos seus passos.
A aldeia estava cheia das pedras onde antes brincou com os amigos à apanhada e às escondidas, mas deles apenas as imagens fugidias. Olhou o sino da pequena capela que agora estava fechada e respirou o ar cortante e puro que a rodeava.
Tudo estava demasiado quieto, tremendamente silencioso. Olhou para o alto e reconheceu a grande figueira onde passava grande parte das tarde de Verão. Naquela altura era a professora dos amigos, obrigava-os a levar livros e trabalhavam durante o calor. Sorriu por se lembrar que a meio do Verão já nenhum lá aparecia e ela ficava sozinha, com os livros todos para si. Passava o resto das férias entre aventuras e estórias encantadas, era um deleite tremendo, pensou.
Voltou a sair do pequeno amontoado de pedras, que antes tinham vida e movimento e pensou em todas as pequenas aldeias, perdidas pelo mundo, onde viveram e cresceram tantas gerações de pessoas e que agora estão condenadas a perecer e enterrarem, com as suas pedras, os ecos dessas vidas. Gostava tanto que as aldeias voltassem ao seu emaranhado de cores, à labuta, à vida...