As palavras andam por aí...
Enrolou o papel pela décima vez. Não conseguia escrever o que queria e o que sentia teimosamente não saltava para o papel. Talvez o que tivesse a dizer não fosse passível de ser colocado num papel branco e encerrado dentro de um envelope. Talvez tivesse de falar, mas não tinha tempo e as palavras teimavam em prender-se-lhe na garganta.
Arrumou a cadeira, levantou-se e caminhou pela floresta. Naquele dia os pinheiros cobriam o céu e os castanheiros teimavam em enviar um dos seus ouriços como presente. Imperava um silêncio perturbante, daqueles só percebidos quando nós próprios estamos imersos em outro maior que o que vive à nossa volta. Agarrou num pequeno galho, de giesta, e à medida que andava torcia-o entre os dedos. Andava e andava e sentia por baixo dos pés as folhas e os ramos a estalarem. Sentiu uma estranha sensação de paz e solidão. Absorveu tudo, com os olhos, com as mãos... tudo era seu por um instante, porque tudo é nosso quando respiramos, intensamente, o que nos envolve.
O vento começou a girar e as folhas rodopiaram como num grande baile. A porta abriu-se, as folhas de papel enroladas varreram o chão e entraram no baile das outras folhas da árvore. As palavras por lá escritas, deambulavam por todo o lado. Queria prende-las, mas não conseguiu. As palavras escritas, vezes sem conta no papel, estavam soltas, encontraram eco no silêncio, viveram no vento e entre as árvores. As palavras são vento e areia, são lágrimas e sorrisos e uma vez escritas, encontram em quem as escuta, a sua habitação protectora. As palavras andam por aí...