Da vida na caixa, à dança...
Acabou de preparar o café, fez as torradas e sentou-se com o cotovelo na mesa e a cabeça na mão. Comia pedaços de pão e olhava em volta como se nada do que a rodeava, ou a vida que vivia fosse real.
Ela não estava dentro daquela vida. Tinha ficado lá atrás, não sabia bem onde, e desconhecia o que fazia ali. Continuou com as suas rotinas, matemáticas, programadas, desprovidas de espontaneidade. A espontaneidade é para os que estão dentro da vida...
Olhou-se ao espelho, ajeitou o cabelo e saiu. Repetiu os mesmos passos e os mesmos gestos que diariamente executava. Continuou a andar pela rua, sem ver nada. Não dava conta que as folhas se lhe colavam à roupa e que a árvore enviava como presente sagrado, nem do riso das crianças que passavam, muito menos era capaz de sentir o sol que insistia em romper as nuvens e beijar-lhe a face...
Estava fechada numa pequena caixa, sem cor, onde a respiração era o único elo com a vida. Tudo o resto era um conjunto de gestos programados, sem significado.
Passou numa rua com muita música, mas ela não a ouviu. Um grupo cantava e dançava e convidava as pessoas que por ali passavam, a acompanha-los. Um rapaz, de estatura média e pele morena, puxou-a para dançar .Ela resistiu , de início, mas a música era tão envolvente que não conseguiu impedir-se de dançar. E dançou tanto que os pés doíam-lhe, e os lábios estavam dormentes de tanto sorrir.
Quando as pernas já não acompanhavam o movimento, sentou-se num degrau, em frente a um vidro e viu-se pela primeira vez em muitos anos. O cabelo desalinhado, a roupa amachucada, o batom esborratado, um sorriso enorme que a fez envergonhar e sorrir ainda mais. Estava viva, pensou. Aquele dia, era um dia!!!!