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Fashion in the bag

Fashion in the bag

17
Jul17

Eram amigos...

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(imagem retirada da net)

 

Olhava os movimentos rápidos e sincronizados do amigo, em volta da roda que teimava em não se soltar. Não sabia quando tinha começado a amizade deles, mas sabia-a pura, desprovida de nenhum interesse que não fosse o que partilhavam. Na realidade talvez ele fosse a pessoa que mais tinha em comum com ela. Faziam tanta coisa juntos que era difícil dizer em que diferiam. Olhava-o e sentia-se agradecida por ele ter entrado na sua vida. Lembrava-se do dia. No início não gostara dele, mas  pacientemente ele mostrara-lhe o quanto estava enganada e hoje era, sem a menor dúvida, muito importante para ela.  Tentava protege-lo do calor e sentia-se um pouco envergonhada por lhe pedir tanta coisa.

Ele estava sempre lá.

Ao longe viu uma cara familiar alguém que tinha visto crescer. Ao vê-la seguiu em frente. Nos olhos corria um ódio que não entendia. Ali, no meio do nada, tinha percebido que as pessoas a quem mais se tinha dedicado, aquelas que imaginou para sempre na sua vida, seguiam em frente. Junto com ela estavam as não ilusões, as não expectativas. Mas eram esses estados de alma a  mostrar-lhe que não esperar nada, por vezes é tão terno que lhe chegava a causar emoção. Ao longe as cigarras cantavam. Ele sentou-se no chão e ela ofereceu-lhe água. Olharam para o céu, viram as estrelas, mesmo sem elas lá estarem e riram - eram amigos.

26
Dez16

O céu numa lata

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 Acordou cedo, com uma ansiedade própria de quem tinha algo importante para fazer. Correu pelas escadas, caminhou pela rua, ainda deserta, e entrou no beco onde ficava a casa da tia de Maria. Era um beco iluminado onde todas as casas tinham pequenas flores azuis nos parapeitos das janelas.

Sempre que a amiga ficava na aldeia era em casa da tia que Maria, ficava. Ela gostava de Maria desde que eram pequenas e nem o facto da amiga ter ido viver para a cidade fez com que se afastassem ou gostassem menos uma da outra.

Bateu levemente e foi a tia que abriu a porta, com ar choroso e triste. Estranhou encontrar a tia de Maria com aquele semblante. Desde que se lembrava ela era alegre e descontraída e muitas vezes acompanhava-as nas risadas e nos passeios. Acompanhou-a para a sala onde Maria se encontrava e não disse uma palavra. Viu a amiga, na penumbra, com rosto magro e com uma expressão muito  abatida. Abraçou-a longamente e , Maria,começou a chorar. Contou-lhe que tinha uma doença rara, que nunca mais poderia ver luz e que os pais tinham decidido que o melhor seria ficar durante uns tempos com a tia, porque tudo ali era mais sossegado.

Ficou quieta, sem falar, com mil coisas a caminharem no seu pensamento. Quis saber tudo, perguntou várias vezes se havia cura e Maria, repetidamente, respondia que não. A partir desse momento em que a amiga lhe contou o seu destino(um fado sem luz, confinado às paredes de uma casa) ela voltava todos os dias e todos os dias tentava que Maria sorrisse. Maria abraçava-a sempre e era, para ela, o melhor momento do dia aquele em que a amiga a visitava.

Um dia, depois de uma luta de cocegas, que as levou ao riso a amiga perguntou a Maria o que é que ela mais desejava. Maria, sorriu, e respondeu-lhe: - Podes apanhar o azul do céu e trazeres-me? (piscou-lhe o olho).

A amiga ficou pensativa, não dormiu nessa noite a pensar no desejo de Maria, mas no dia seguinte subiu a um pequeno monte e pediu ao céu que entrasse dentro de uma lata porque a amiga precisava dele para melhorar.

O céu vaidoso, mas cândido entrou na pequena lata que ela lhe oferecia. Ficou quieto e deixou-se estar enroladinho até que a tampa se soltou e ele viu os olhos mais bonitos que existiam. Nesses olhos viviam os sonhos de uma menina que queria crescer e da amiga que nunca desistiu de querer apanhar o céu para lhe dar.

22
Nov16

O preço ou o valor das coisas?

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Chegava ao café do Senhor Alberto ainda cedo, sentava-se na cadeira perto da porta, folheava os jornais e esperava que o Inácio chegasse. Há muito que iam juntos para o trabalho. Ela simpatizava com Inácio, mas não podia dizer que gostava dele. Na realidade o colega era um hábito, alguém que a impedia de começar o dia sozinha. 

Assim que chegava Inácio atirava-lhe com um bom dia mal disposto, pedia um café e sentava-se desajeitadamente na sua mesa. Ela alinhava os jornais, olhava de lado para ele que começava a falar, imediatamente.

O monólogo habitual tinha sempre o mesmo tema: o preço das coisas. Contava sobre o filho, dono do melhor computador, acerca do carro que tinha custado muito dinheiro, nas férias à Indonésia que tinham custado "os olhos da cara", no café cada vez mais caro, no sofá que ia comprar para o Natal e que era o mais dispendioso de todo o prédio. Nem o vizinho Fernando,empresário na área das carnes, tinha um tão caro, dizia ele.

No fundo ele coleccionava coisas caras, pensava ela. Era um coleccionador de nadas.

Ouvia-o, esboçava um leve sorriso,  calava-se. Todos os dias era o mesmo enfadonho rol de palavras, a mesma ladainha sobre coisas, sobre preços. Uma conversa que escondia, o vazio em que Inácio se encontrava. Um desenrolar de palavras que não tinham um eco seguro, que apenas desfilavam, à frente de todos, mas onde não existia cor. Ela via claramente isso, mas deixava-o viver aqueles momentos de garantida satisfação. Isso aconteceu durante anos.

Um dia, era um dia de chuva, tenho a certeza. Ele falava sobre a roupa que o filho tinha, comprado no dia anterior.

- Só a camisola tinha sido quase o valor de um salário mínimo, esclarecia ele.  Nesse dia ela sentiu uma perturbação que desconhecia, tentou tapar a boca com a mão, prender as palavras que ameaçavam sair, mas não conseguiu e quando se apercebeu já o olhava nos olhos perguntando-lhe em tom indignado: - E o valor da camisola e o valor de tudo o que tens? Sabes qual é? É que o valor é muito mais elevado que o preço, não te parece? O que tens tu que realmente seja valioso? Inácio calou-se, colocou o café de lado, baixou os olhos e caíram-lhe lágrimas sobre o fato elegante. Ela  ficou incomodada, olhava para o chão, inquietava-se com o som que as suas palavras ainda produziam. Um som duro, cortante, demolidor. 

Ao fim de um tempo, que pareceu longo, ele respondeu-lhe: Aquilo que tenho mais valioso na vida são os momentos que passo contigo, todas as manhãs, mas esses não têm preço. Esses não te consigo dizer quanto custam. Sorriram os dois e foram juntos para o trabalho, naquele dia, como verdadeiros amigos.

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