Voar...
Olhei para o pinheiro alto, que tinha a sua enorme cabeleira, verde, coladinha ao céu. As pinhas enfeitavam-lhe os ramos como brincos em orelhas de senhora. Suspirei e olhei demoradamente para o azul e verde que agora me entrava pelos olhos. Uma das pinhas caiu e veio devagarinho bater-me no pé ficando ao lado de outras pinhas que já descansavam. Pensei no seu propósito, na justificação da sua queda, e percebi que as pinhas não temem o vento nem a queda porque elas realizam a sua natureza, realizam-se a si próprias com a descida. As pinhas vivem para voar e voam!
Mesmo que o trajecto seja insignificante, mesmo que ninguém acredite que elas voam e digam que só caem, elas sabem o que é sentir, por momentos, o medo do desconhecido, a hesitação, mas ao mesmo tempo a vontade enorme de fazerem o que sempre quiseram. No inicio estão fechadinhas, brincam umas com as outras e aproveitam os pequenos sopros, que o vento lhe oferece, até ao dia em que as suas diminutas asas, agora abertas, pedem mais do que sopros, elas querem o vento por completo, elas precisam de saber como é Voar.
Deixam-se ir, temerosas, sem saber se vão resistir à queda, mas voam e voam muito, porque é dentro delas que vive o maior voo. Quando tocam no chão, nada mais importa do que aquilo que saborearam até lá chegar. E o que sentiram é de uma tal dimensão que nem dão pela queda. Para que interessa uma queda quando se voa??